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Literatura

Antropólogo baiano lança livro sobre a condição negra em Paris

Entre outras dimensões da pesquisa, o livro aborda a desigualdade social e a exclusão como fruto das tensões raciais não reconhecidas pela sociedade francesa

Foto | Divulgação

Um olhar sobre a população negra em Paris, com as nuances que assemelham e diferenciam os descendentes de africanos e migrantes do continente que moram ali daqueles que vivem em outras partes do mundo. Essa é a proposta do livro Cadernos de Paris – Ensaios sobre a condição negra na cidade luz, do antropólogo baiano Ari Lima, que será lançado no dia 17 de setembro, no Centro de Estudos Afro-Orientais (Dois de Julho), 18h, com acesso gratuito.

As relações raciais são uma constante na vida acadêmica de Ari, inicialmente dentro do universo da música. No mestrado, ele abordou a ascensão da Timbalada, enquanto no doutorado estudou o pagode. Em 2018, o antropólogo começou a pensar no pós-doutorado que deu origem ao livro, publicado pela editora Cajuína, uma proposta de discutir a questão racial fora do Brasil.

“Achei interessante pensar sobre o contexto francês, porque os pesquisadores franceses foram importantes na formação desse campo de estudos sobre relações raciais e cultura negra no Brasil. E também descobri que, de modo geral, eles se recusam a reconhecer que existe desigualdade social, que existe exclusão, que existem mecanismos distintos do sujeito se constituir como cidadão”, conta.

Então ele partiu para Paris, onde permaneceu por um ano, vivendo a cidade para fundamentar e desenvolver seu estudo. Nesta aproximação, Ari Lima identificou três grupos distintos: os imigrantes africanos; os filhos de imigrantes que já são franceses; e os descendentes de africanos escravizados nas Antilhas, que são franceses de além-mar. 

Os ensaios de Cadernos de Paris apresentam o resultado dessa busca em “entender como a questão racial e a desigualdade racial se constituem neste contexto específico, importante para o mundo inteiro, mas por outro lado se recusa a pensar sobre o tema no seu próprio território”.

Tensões raciais

A temporada de pesquisa de Ari ocorreu entre 2018 e 2019, mas as tensões recentemente evidenciadas na cruzada do presidente Emmanuel Macron contra a ascensão da extrema-direita já eram palpáveis. “Durante um longo período da história da França, ela escravizou, colonizou, mas bloqueou o acesso dos colonizados escravizados ao país. A França começa a receber uma quantidade grande de imigrantes negros apenas no século XX, principalmente após a 1ª e a 2ª guerras mundiais”.

Com a dificuldade de obtenção de mão de obra, a França começou a estimular a imigração, dispensando até mesmo o visto dos oriundos de países de colonização francesa. Mas bastaram poucas décadas para passarem a encarar o crescimento dessa população como problema, revisando as leis. Os descendentes desses imigrantes, mesmo já nascidos no país, têm a sua identidade constantemente questionada.

“Recompor a França para os franceses” é o discurso que tem sido encampado pela extrema-direita no país, reforçando uma ideia de disputa entre os chamados ‘franceses gauleses’ (leia-se brancos) e os imigrantes com seus descendentes, tanto no mercado de trabalho quanto no acesso aos serviços públicos. “No contexto europeu, a França ainda é um dos poucos países que se constitui como uma sociedade de bem-estar. O ensino é público, a saúde é pública e o Estado oferece uma série de benefícios a quem é cidadão”, ressalta Ari.

Há ainda uma rejeição de parte da população à cultura e os costumes que consideram característicos dos descendentes de africanos e imigrantes. Na área suburbana de Paris, o antropólogo percebe uma forma de viver que se assemelha à vista nos bairros populares de Salvador. Pessoas vendendo produtos nas ruas, conversas em volume elevado e em tom informal são alguns desses pontos.

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