O recém-inaugurado Morea Asian Fusion apresenta a face mais atual da linguagem de Vinícius Rosaneli, marcada pela integração entre tecnologia, arte e biofilia como instrumentos de construção atmosférica. O projeto transforma o rooftop em campo arquitetônico, onde materialidade, luz e narrativa configuram uma experiência gastronômica contínua.
Em paralelo, o Soho Marina, consolidado como um dos ícones gastronômicos de Salvador, evidencia a precisão do arquiteto ao reinterpretar preexistências, organizar fluxos e estruturar um espaço de permanência. Em conjunto, os dois projetos revelam a maturidade de Rosaneli e sua capacidade de atribuir identidade, ritmo e profundidade aos ambientes dedicados à gastronomia.
PROJETO MAREA

Os murais de Felipe Ikehara ocupam os planos arquitetônicos e estabelecem uma narrativa visual que combina figuração, simbolismos e gestos fluidos. Suas composições acompanham as inflexões do espaço e introduzem ritmo, profundidade e tensão gráfica. As áreas com folha de ouro marcam pontos estratégicos e ampliam a leitura artística do ambiente.
Localizado no ponto mais alto do Horto Florestal, o Morea Asian Fusion nasce como um espaço que ultrapassa fronteiras geográficas e insere o público em um contexto que poderia compor o repertório de qualquer capital do mundo. Arquitetura e gastronomia operam como camadas complementares estruturadas pela fusão entre conceito e matéria e orientadas por um rigor sensível que equilibra intenção e precisão. O projeto assinado por Vinícius Rosaneli transforma o rooftop em campo perceptivo e intensifica o que antecede e prolonga o ato de degustar.
A ATMOSFERA COMO MATÉRIA
O interior foi concebido como uma zona de transição que reorganiza a leitura espacial. Curvas, luz modulada e circulação fluida estabelecem continuidade, eliminando rupturas visuais. A arquitetura assume função direcional, estruturando o percurso, enquanto a iluminação difusa calibra contrastes, temperaturas e profundidades. Cada componente integra essa lógica, articulando superfícies, volumes e materialidades em um conjunto coeso e orientado pela clareza do desenho.
O TETO COMO GEOMETRIA SENSORIAL
O musgo natural estabilizado forma um canopy orgânico que percorre o restaurante e redefine o teto como superfície ativa. Resultado de processos tecnológicos que preservam cor, textura e volume sem necessidade de irrigação ou luz solar, o material associa inovação e desempenho ambiental. A camada suspensa dilui limites e introduz uma leitura espacial alinhada à biofilia presente em projetos contemporâneos de Tóquio, Cingapura, Londres e Nova York. Além de seu impacto visual, o elemento aprimora a acústica, regula a absorção sonora, reduz reverberações e contribui para o conforto. Sua utilização reforça a imersão proposta pelo projeto.
ARTE E NARRATIVA
As obras de Felipe Ikehara ocupam as paredes curvas e os planos verticais que contornam o salão, estabelecendo uma continuidade gráfica que integra pintura e arquitetura. Seus murais combinam figuração, simbolismos universais e paletas suavizadas que contrastam com a densidade dos materiais e com o repertório visual contemporâneo. As figuras femininas, ondas, linhas dinâmicas e organismos marinhos funcionam como camadas interpretativas que acompanham o percurso e modulam a leitura do espaço. O artista utiliza folhas de ouro como recurso cerimonial e expressivo, aplicadas em pontos estratégicos que realçam transições arquitetônicas e enfatizam os elementos estruturais do projeto. Aplicada com maestria, a nobre película cria pontos de luz que dialogam com a iluminação intimista. O metal precioso acentua passagens, marca colunas e introduz refinamento e sensorialidade. Seus reflexos conduzem o olhar a instantes de contemplação.
DESIGN, MATÉRIA E ORGANICIDADE
O mobiliário desenhado por Rosaneli organiza a circulação com fluidez intuitiva. Sofás contínuos em curvas configuram núcleos de convivência e instauram uma hospitalidade contemporânea. As mesas em pedra natural revelam veios como escrita geológica, enquanto a marcenaria imprime calor tátil. A composição entre pedra, madeira, tecidos, metais e vegetação equilibra peso e leveza, artesania e desenho contemporâneo. O resultado é um ambiente que acolhe o rito e conduz o percurso por meio de texturas e volumes.
COSMOPOLITA SEM COORDENADAS
Inserido na paisagem soteropolitana, o Morea adota uma diretriz arquitetônica que se projeta além de referências locais. Materiais naturais, arte contemporânea, luz filtrada, vegetação suspensa e mobiliário fluido constroem uma identidade alinhada a diferentes centros urbanos. O rooftop revela uma ambiência intimista, onde nuances se articulam em camadas sutis. O dossel verde suspenso, a pedra sob as mãos, o brilho que incide nos murais, a figura feminina insinuada no desenho e o ritmo interno que pulsa como uma cidade possível configuram uma narrativa que desloca e amplia o campo perceptivo.
A EXPERIÊNCIA IMERSIVA
No Morea, tudo opera em escala elevada. A arquitetura delineia horizontes, a arte estrutura narrativas, o musgo cria relevo e a iluminação define o clima. A vivência é atemporal. A fusão transcende a cozinha e se afirma como eixo do projeto, articulando materiais e atmosferas em uma síntese precisa.
PROJETO SOHO

Localizado na Bahia Marina, um dos cenários mais emblemáticos da Baía de Todos os Santos, o projeto atualiza a espacialidade do restaurante com uma arquitetura guiada pela luz, pela materialidade natural e pela experiência sensorial. Primeiro restaurante japonês da Bahia, o Soho sempre conciliou tradição e experimentação, e a intervenção de Vinícius faz essa essência emergir com precisão e silêncio, devolvendo coerência, conforto e acolhimento ao espaço.
O Soho Marina ressurge renovado, mais acolhedor, mais sereno e profundamente conectado à paisagem. O retrofit conduzido por Vinícius revela um entendimento sensível do que deve permanecer e do que precisa evoluir. Luz, matéria e contexto se articulam em uma nova atmosfera, na qual cada elemento, do balcão escultórico às nuvens acústicas, dos painéis têxteis ao desenho da varanda aberta, fortalece a identidade do restaurante sem romper com sua história.
A intervenção avança além da reorganização espacial e requalifica fluxos, valoriza a cultura material baiana, reduz impactos operacionais e torna a arquitetura mais consistente, oferecendo um ambiente eficiente, sustentável e sensorial. O projeto reafirma o compromisso do estúdio com a permanência, com o rigor técnico e com uma estética que privilegia silêncio, textura e profundidade temporal. Entre o mar, o vento e a luz que se transforma ao longo do dia, o Soho Marina inicia um novo capítulo, um ícone contemporâneo que honra seu legado, acolhe quem chega e permanece fiel à sua essência, agora revelada com clareza renovada.
LUZ, MATÉRIA E ATMOSFERA
O estúdio parte da premissa de que a arquitetura se constrói entre presença, tempo e contexto. No Soho, esse princípio se traduz na criação de atmosferas que se transformam ao longo do dia, neutra e aberta pela manhã, imersiva, intimista e profundamente sensorial à noite. A renovação solucionou infiltrações, atualizou sistemas e substituiu a antiga cobertura por telhas shingle, que garantem leveza, durabilidade e ótimo desempenho termoacústico, criando uma superfície contínua e silenciosa que se integra naturalmente ao desenho arquitetônico. A luz foi tratada como linguagem. Entre rasgos, difusões e dimmers, ela estabelece o ritmo do espaço e conduz o olhar. De dia, a claridade dissolve a arquitetura em direção ao mar; à noite, revela volumes e texturas.
O BALCÃO COMO EIXO CENTRAL
A intervenção redefine o balcão como coração do restaurante. Antes discreto, ele se torna elemento estrutural e simbólico, concentrando as estações de sushimen, o bar de drinks e o DJ, organizando o percurso e qualificando o ambiente. A ilha de trabalho foi ampliada, passando de quatro para oito estações de sushi, o que otimiza o fluxo, amplia a capacidade de atendimento e reforça a dinâmica da cozinha japonesa ao vivo.
Nas laterais do balcão, biribas de madeira seca carbonizadas criam um volume escultórico que abraça a peça e acentua sua presença no espaço. As biribas passam por um processo de carbonização inspirado no Shou Sugi Ban, técnica tradicional japonesa que utiliza o fogo para proteger e fortalecer a madeira. O tratamento intensifica a textura, realça o desenho orgânico dos galhos e cria uma superfície escura e vibrante à luz. A face frontal, iluminada por trás, recebe uma lona tensionada com impressão de fumaça, fotografada especialmente para o projeto. Essa camada difusora transforma o balcão em uma espécie de luminária japonesa expandida, onde gesto artesanal e precisão construtiva se encontram. A decisão de elevar a altura do balcão estabelece proporção e presença, alinhadas à estética de síntese do arquiteto.
NUVENS NO TETO E ACÚSTICA
O teto original, com tesouras metálicas aparentes, agora integradas ao novo desenho e valorizadas como parte da memória espacial do restaurante. Vinícius instalou planos acústicos revestidos em linho, criando “nuvens” suspensas que suavizam a reverberação sonora e estruturam a luminosidade. Entre esses planos, prateleiras desenhadas por Vinícius em chapa de alumínio se acoplam à estrutura metálica e flutuam levemente acima do sushi bar. Retroiluminados, funcionam como uma estante aérea minimalista e expressiva, organizando garrafas, objetos e volumes, enquanto aproveitam o pé-direito e mantêm a circulação clara e fluida. O resultado equilibra leveza e rigor, acrescentando profundidade ao teto e transformando o conjunto em uma paisagem interna que complementa, sem competir, com a vista da marina.
PAINÉIS ESCULTÓRICOS E A MATERIALIDADE NATURAL
Ao longo de toda a lateral do salão, surge um painel escultórico em faixas de tecido em tom terroso, criação de Vinícius, um exercício lúdico de ritmo, movimento e variação espacial. Sustentadas por estrutura metálica, as faixas se projetam e se inclinam, formando uma superfície contínua de cheios e vazios. A iluminação horizontal embutida acentua as dobras e conduz o visitante, criando uma presença arquitetônica silenciosa. Para além do balcão, o painel estabelece a identidade do salão, atuando como elemento acústico e composição autoral que sintetiza a linguagem essencialista do estúdio. Entre os materiais utilizados no projeto, destacam-se o quartizito baiano à base de xisto, a madeira, o linho, o metalon e a pedra natural, uma paleta que valoriza textura, durabilidade e a capacidade de dialogar com o tempo.
ÁREAS DE CONVIVÊNCIA E CONFORTO
Em diferentes pontos do restaurante, sofás contínuos reforçam a vocação acolhedora do Soho. Revestidos em couro, dispostos em “L” ou ao longo das paredes, criam nichos amplos para grupos, ampliando a permanência e convidando a uma experiência mais descontraída e generosa. No salão interno, o sofá acompanha o painel de madeira ripada que aquece o ambiente e dialoga com as obras em grafite da artista Fernanda Krapp. Próximo à varanda, um segundo espaço de convivência recebe um conjunto de sofás que enquadra a vista e dialoga com o brise de biribas carbonizadas, mantendo a coerência material do projeto. Esses ambientes funcionam como respiros entre as áreas de fluxo e movimentação do balcão, pontos de pausa, conversa e contemplação, uma marca da sensibilidade de Vinícius em articular conforto, textura e espacialidade.
VARANDA ABERTA E A PAISAGEM COMO PROTAGONISTA
A varanda original, aberta, foi mantida para preservar a arquitetura existente e a relação direta com a água, com o vento e a paisagem da Baía de Todos os Santos. Durante o dia, a arquitetura se recolhe para que a paisagem ocupe seu protagonismo, com o Elevador Lacerda, o Forte de São Marcelo e o azul da baía, como parte natural da experiência. Ao entardecer, quando o sol se põe, a varanda se transforma em um dos momentos mais emblemáticos do Soho. À noite, a luz interna reassume a condução e devolve profundidade ao espaço. A escolha por mobiliário em couro caramelo e madeira clara suaviza o olhar e cria continuidade com o interior.
JARDIM DE ESPERA | TRANSIÇÃO E PAUSA
O lounge externo foi redesenhado como um jardim baiano contemporâneo. Bambu, pérgola de madeira e mobiliário artesanal criam um espaço de pausa, onde a natureza funciona como filtro entre a movimentação da marina e o ambiente do restaurante.
BANHEIROS | O RITUAL E O DETALHE
Os banheiros trazem referências sutis ao universo japonês, com portas que recebem artes de gueixa e samurai, marcando uma presença visual simbólica. Cubas esculpidas em travertino turco, luz pontual e desenho sintético reforçam a sensação de cuidado e ritual.




















