Largo do Pelourinho – 10! No coração do Centro Histórico de Salvador, a Casa da Ponte passa a ocupar todos os ambientes de um casarão do século XVIII, após quase dois anos em recuperação de sua infraestrutura. A inauguração oficial da casa-sede da Orquestra Afrosinfônica, da escola Núcleo Moderno de Música, da Ponte para as Comunidades e outros projetos idealizados pelo maestro Ubiratan Marques será no dia 13 de outubro, a partir das 17h, para convidados.
A Casa da Ponte, tombada pelo Iphan, com 862m², está situada na poligonal do Centro Histórico, sítio reconhecido pela Unesco, de frente à Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos e ao lado da Fundação Jorge Amado e casarios centenários. A sua infraestrutura original foi mantida ao passar pelo retrofit, tendência arquitetônica que faz prédios antigos renascerem.
As intervenções adaptaram o imóvel com sala e estúdio para apresentações, ensaios e gravações da Afrosinfônica, espaços para aulas de músicas coletivas e individuais do Núcleo Moderno de Música, salas de reunião, administração e para o corpo docente. A reforma inclui o restauro de esquadrias, forros, assoalhos, cobertura e nova infraestrutura hidráulica e elétrica.
Espaços variados
No quintal, que se descortina para o belo cenário da Baía de Todos os Santos, será construído um deck, um espaço contemporâneo com café e para apresentações de alunos e pockets concertos. Assim como na música, o moderno e o ancestral, o presente e o passado se integram também nas escolhas de matérias de decoração e nos móveis.
“Entramos no casarão no final de 2018 e, quando começamos a planejar a reforma, logo veio a pandemia. Neste período, o seu estado ficou mais crítico, devido à chuva que deteriorou mais o telhado. Com a aprovação do projeto Ponte para a Comunidade, fomos fazendo pequenos reparos para utilizar uma sala. É importante dizer que esta casa não foi construída para pessoas como nós, mas por pessoas como nós, pelas mãos dos nossos ancestrais. Simbolicamente, agora ele é um espaço ocupado por um projeto voltado para a população negra, pensado exatamente por uma pessoa negra”, afirma o maestro Ubiratan Marques, idealizador da Casa da Ponte.
O Núcleo Moderno de Música é que dá início à história da Casa da Ponte. A escola idealizada por Ubiratan e Gilberto Santiago iniciou no casarão, quando ainda funcionava em salas alugadas, de 2009 a 2011. A partir das aulas, foi o berço do surgimento da Afrosinfônica, além da realização dos processos criativos e ensaios para a gravação do primeiro álbum, o Branco.
Ensaios e escola de música
Com permissão de uso do imóvel pela Casa da Ponte, em 2018, o Núcleo passou a atuar efetivamente como escola de música voltada para um público já iniciado musicalmente e conta com cursos de qualificação, especialização e para iniciantes. Lá também foram realizados todos os ensaios da orquestra para a gravação do álbum Dois.
“O importante agora é o processo do que vamos fazer a partir da reforma. Estamos montando um estúdio, que vai permitir à orquestra e outros artistas fazerem todo o processo de gravação na Casa da Ponte. O BaianaSystem já gravou lá algumas músicas, mas levou o próprio equipamento. Muitas coisas já foram feitas lá como ensaios com Mateus Aleluia, Marisa Monte, Gerônimo, Lazzo e os blocos afros””, lembra Ubiratan.
Projetos com artistas
No início de abril, Marisa Monte, ao lado da orquestra Afrosinfônica, com arranjos de Ubiratan Marques, apresentou um concerto beneficente em prol da “CESE: Música e Direitos Humanos”, na Concha Acústica. Com este evento, a cantora entrou na vida da Casa da Ponte, onde participou de ensaios e visitou o Pelourinho.
Na ocasião, a cantora disse estar “muito empolgada com a possibilidade de trabalhar com o maestro Ubiratan Marques e a extraordinária Orquestra Afrosinfônica, com sua linguagem própria e uma identidade única”. A parceria deu tão certo que algumas músicas estarão no repertório da próxima turnê da artista.
O maestro é responsável pelos arranjos da Afrosinfônica em outros importantes momentos com estrelas da música brasileira. A convite da BaianaSystem, a orquestra participou do projeto Negritudes, exibido no Fantástico, com a música Eu sou Negão, que contou com as participações do Olodum, Gilberto Gil, Russo Passapusso e Luedji Luna. No mesmo projeto, assinou os arranjos junto com Brown na música “Muito Obrigado, Axé”.
Já o encontro da Afrosinfônica com Maria Bethânia se deu no concerto Música & Direitos Humanos em louvor aos Direitos das Mulheres, em 2015, no Teatro Castro Alves. Um show que celebrou o popular e o erudito nos arranjos de Ubiratan Marques para as músicas escolhidas pela cantora, de Dorival Caymmi, Gil e Caetano. “Orquestra tinha 5 anos e as mulheres negras se destacam na sua formação. Foi um momento incrível, um concerto lindo, que celebrou a ancestralidade africana”, lembra Ubiratan.
Sociocultural
Como organização sociocultural, em 2024, a Casa da Ponte desenvolveu o seu primeiro projeto voltado para a educação e a formação musical nas comunidades de Salvador. Idealizada pelo maestro Ubiratan, a primeira edição do Ponte Para a Comunidade formou oito Orquestras Afrobaianas, entregues para serem administradas por oito organizações: Ilê Aiyê, Banda Didá, Olodum, Pracatum, Cortejo Afro, Filhos de Gandhy, Malê Debalê e Grupo Étnico Cultural Bairro da Paz.
O projeto, viabilizado pela Lei Federal de Incentivo à Cultura, Ministério da Cultura e que contou com patrocínio Nubank, deverá, nos próximos dias, abrir as inscrições para a segunda edição. No ano passado, o Ponte Para a Comunidade atendeu cerca de 1.500 alunos, de todas as idades, que frequentaram as aulas de educação e formação musical na Casa da Ponte, nos polos formados nos bairros Centro Histórico/Pelourinho, Candeal/Brotas, Curuzu/Liberdade, Pirajá e Bairro da Paz.
Além de uma extensa programação cultural, como concertos e ensaios abertos da Afrosinfônica, espetáculos musicais com alunos, no interior da Casa da Ponte, o maestro Ubiratan Marques desenvolveu um calendário de eventos que envolverá os bairros de Salvador e outros municípios. Recentemente, o projeto Ponte Para as Filarmônicas reuniu, em São Felix, bandas de Santo Amaro, Cruz das Almas, Cachoeira, Muritiba, Acupe e São Félix. A partir de dezembro, a Orquestra Afrosinfônica iniciará uma série de concertos, com participações especiais, nas escadarias da Fundação Jorge Amado, no Pelourinho.