O uso das chamadas canetinhas emagrecedoras, como Ozempic, Wegovy e similares, se popularizou recentemente como opção para perda de peso e tratamento do diabetes tipo 2. No entanto, o tema tem gerado controvérsias quando envolve cirurgias eletivas e anestesia geral. Isso porque três Sociedades Brasileiras – de Anestesiologia, Endocrinologia e Diabetes – recomendam formalmente a suspensão do uso dos medicamentos antes de procedimentos com anestesia geral.
O motivo seria um possível atraso no esvaziamento gástrico causado pelos análogos do GLP-1, substâncias que imitam um hormônio produzido pelo intestino e que ajudam a controlar o açúcar no sangue, promovem saciedade e retardam a digestão. É esse efeito que os torna eficazes no emagrecimento, mas também o que pode aumentar o risco de aspiração de conteúdo do estômago para os pulmões durante a anestesia, uma complicação potencialmente grave.
No entanto, essa recomendação não é consenso. O médico anestesiologista e presidente da Cooperativa dos Médicos Anestesiologistas da Bahia (Coopanest Bahia), Hugo Dantas, afirma que a suspensão rotineira da medicação deve ser tratada com mais cautela. “Essa recomendação é extremamente restrita e adotada, até o momento, por poucos países no mundo, a exemplo do Brasil e da Nova Zelândia. Em outubro de 2024, a American Society of Anesthesiologists (ASA), principal referência mundial na área, publicou um parecer oficial desaconselhando a suspensão desses medicamentos no pré-operatório”, explica o médico.
Paciente deve informar uso
De acordo com Hugo, a conduta ideal é avaliar caso a caso, principalmente se o paciente apresenta sintomas gastrointestinais ativos, como náusea, refluxo ou sensação de estômago cheio. Ele alerta que a orientação brasileira, apesar de ter respaldo legal, tem provocado cancelamentos e adiamentos desnecessários de cirurgias, levando a suspensão de inúmeros procedimentos de forma irrestrita após o paciente relatar o uso da medicação durante a consulta pré-anestésica.
“A ausência de sintomas não necessariamente significa risco. O mais importante é que o paciente informe o uso do medicamento na avaliação pré-anestésica para que a equipe tome a melhor decisão. O problema é transformar isso em uma regra geral, quando ainda estamos diante de um cenário novo, que exige mais estudo e atualização constante das diretrizes clínicas”, reforça.
A consulta com o anestesiologista, muitas vezes subestimada, é uma etapa fundamental para a segurança do paciente no pré-operatório. É nesse momento que o profissional avalia o histórico médico, os medicamentos em uso, o estado clínico e define a melhor estratégia para o procedimento, reforçando seu papel essencial na equipe cirúrgica.
Os pacientes que utilizam as chamadas canetinhas emagrecedoras e vão passar por cirurgia devem sempre informar ao médico e conversar com o anestesiologista. O relato desse uso é fundamental para que a equipe possa avaliar o caso com segurança e oferecer a melhor conduta possível, considerando as recomendações atuais e as particularidades de cada paciente.
