Por Rodrigo Carreiro (jornalista e doutor em comunicação e cultura contemporânea) – Especial para o Bahia Social Vip
Falar sobre a música baiana no últimos 15 anos é, inevitavelmente, falar sobre BaianaSystem e sua mistura particular de rap, axé, pagode, afoxé, samba e cultura soundsystem. Esse status, no entanto, já extrapolou os limites locais e o novo álbum lançado pela banda, O Mundo Dá Voltas, é mais uma prova disso. Partindo das mesmas influências que os consagraram, o Baiana consegue se aprofundar nesse universo que apresenta uma mistura fina de ritmo, poesia e discurso.
Ouvir esse álbum é como reconhecer num velho amigo a mesma personalidade que você já conhece, porém com muito mais experiência e segurança de si. E falando em amigos, O Mundo Dá Voltas’ é uma dança coletiva. Russo Passapusso, Roberto Barreto e companhia conseguiram reunir um time de peso para ajudar a contar essa história.
A lista de participações é quase tão extensa quanto a capacidade de desenhar formas musicais ao mesmo tempo difusas e coerentes. Músicas como “A Laje”, parceria com Melly e Emicida, e “Batukerê” trazem um frescor reconfortante em beats mais desacelerados, que aproveitam o que de melhor esses artistas tem a oferecer dentro de seus universos particulares.
Canções mais lentas que o habitual punch da banda são uma marca importante desse álbum. A guitarra baiana, elemento que demarca bem o território de onde vem a banda, não deixa de estar presente. É ela quem conduz a orquestra e passeia por toda “Praia do Futuro”, um convite generoso que Russo e Seu Jorge endereçam a quem curte samba rock.
Como o próprio Russo deixa claro, ele é “sul-americano de Feira de Santana”, um modo nada delicado de se livrar de qualquer amarra conceitual sem que seja preciso esquecer sua origem. E é justamente esse encontro, entre referências latinas e afrobrasileiras, que nos vemos imersos nos ritmos contagiantes de “Porta-retrato da Família Brasileira” e “Magnata”. A primeira é mais lenta e é simples em associar samba e dance hall. A seguinte é o ponto de equilíbrio entre o último trabalho do grupo e esse atual, trazendo a batida de Buguinha Dub para dentro da festa.
Em meio a tantas referências, parcerias e conceitos, o disco tem breves momentos em que a fórmula parece se desgastar. Mas daí entra a voz inesgotável de Gilberto Gil para sublinhar com linhas fortes as raízes baianas da banda, revelando que “Pote D`Água˜ é uma canção gostosa de se ouvir ao ritmo do ijexá turbinado que só o Baiana consegue fazer.
Mais cosmopolita é a parceria com Pitty e Vandal, em “Cobra Criada/Bicho Solto”, que entrega groove com discurso afiado, bem como a décima primeira faixa do álbum “Balacobaco”, quase escondida, que convida a esse universo a estrela pop Anitta. No começo a participação dela parece deslocada, mas no final da música você já está cantando junto.
O disco ainda é recheado de vinhetas, frases musicais (alguns quase mantras, como “o mundo dá voltas” repetido em diferentes momentos do trabalho) e recortes que certamente poderão ser apreciados nos shows apoteóticos da banda. É uma colagem de ideias, discursos e ritmos que dá continuidade ao que o Baiana tem para oferecer ao mundo.