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Crítica – Eu Me Importo

Devo dizer que Eu Me Importo não é um filme para qualquer um. Não por ser algo complexo, de difícil entendimento ou apreciação, mas por construir uma comédia sombria ao redor de personagens que não são exatamente simpáticos e com um absurdo crescente que pode dificultar a imersão de algumas pessoas. Nada disso quer dizer que se trata necessariamente de um filme ruim, mas se trata de um produto que pode dividir opiniões.

A narrativa é protagonizada por Marla (Rosamund Pike), uma mulher que trabalha como tutora de idosos que são colocados sob a tutela do Estado. Marla, no entanto, vê esses idosos como meras formas de enriquecer, rapidamente colocando-os em asilos e depois vendendo todos os bens deles para lucrar. Marla vê uma oportunidade de faturar alto em cima de Jennifer (Dianne Wiest), uma idosa endinheirada e aparentemente sem família. Depois de conseguir tomar o controle dos bens de Jennifer, Marla descobre que a idosa tem conexões com o mafioso russo Roman (Peter Dinklage) e então começa um perigoso embate entre Marla e Roman.


Rosamund Pike já tinha mostrado em Garota Exemplar (2014)o quanto é boa em interpretar uma sociopata de personalidade magnética e aqui faz um tipo similar. Marla é implacável, ardilosa, manipuladora e sem escrúpulo, sendo humanizada apenas pela relação com a namorada Fran (Eiza Gonzalez). Os primeiros minutos do filme chegam a ser difíceis de acompanhar por conta da desumanidade com a qual ela trata os idosos sob sua tutela e torcemos para que ela tenha o que merece.

Se de um lado temos uma pessoa horrível, do outro temos alguém igualmente horrível em Roman, um criminoso cruel e violento, mas cheio de excentricidades, que tem um afeto genuíno pela mãe. Assim como Marla, ele tem carisma e humanidade o suficiente para que nos interessemos por eles, mesmo conscientes de que são péssimos seres humanos. O embate entre os dois logicamente se agrava e se torna mais perigoso e violento conforme a trama progride, no entanto o conflito também vai se desenvolvendo de modo cada vez mais exagerado e absurdo, o que não vejo problema (afinal trata-se de uma comédia), mas que imagino que nem todos irão embarcar.

Em meio a todo o embate entre os dois personagens, a trama toca em questões sobre a natureza predatória da indústria de cuidadoria de idosos que, como boa parte das instituições do capitalismo, coloca o lucro em primeiro lugar ao invés do bem-estar das pessoas. A ideia de asilos como um local de maus-tratos e violência psicológica ao invés de espaço de cuidado dialoga com o movimento antimanicomial e necessidade de repensar esses espaços. Do mesmo modo, a facilidade com a qual Marla consegue interditar judicialmente suas vítimas, extraindo a autonomia delas, mostra as fragilidades do sistema jurídico e como ele pode ser facilmente explorado, já que uma vez interditada, é difícil que a vítima consiga convencer os outros que permanece em pleno domínio de suas faculdades mentais.

São temas importantes de tratar, no entanto, ao longo trama são deixados de lado em prol do conflito entre Marla e Roman, nunca sendo plenamente desenvolvidos. Assim, fica a impressão de que essas questões ficam apenas em observações superficiais quando poderiam ter rendido mais. Por mais que haja uma boa dose de ironia e cinismo em ver que mesmo toda a truculência do crime organizado não é capaz de enfrentar a implacabilidade do capitalismo e modo como o capital controla as instituições sociais, incluindo o judiciário, fica a impressão de que o texto nunca se decide plenamente se quer usar a comédia para fazer uma crítica social ou apenas explorar a rivalidade absurda (e divertida) dos dois personagens principais.

Os protagonistas de Eu Me Importo não são exatamente fáceis de acompanhar, mas tem carisma e eventos insólitos o suficiente para fazer essa comédia sombria valer a pena.

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